Acabo de sair do colégio. Aula à tarde é uma completa perda de tempo.
Não quero ir pra casa. Tenho redação pra fazer. Só quero um lugar pra sentar, e deixar o tempo correr.
Lembro que tenho dinheiro na carteira, passo no mercado, e por incrível que pareça não compro chocolate.
Caminho pela avenida, sob aquele sol terrível, desejando uma sombra. Começo a repassar o caminho pra casa, tentando me lembrar de algum banco que possa haver, e como nenhum me vem à memória, faço críticas à gestão do atual prefeito. Pra que plantar flor na cidade inteira?! Por que não haver bancos, mesas de xadrez, debaixo de uma árvore, para as pessoas simplesmente gastarem seu tempo, deixando pra depois algo que não as interessam no momento?!
Como não encontro nenhum dos já citados meios, sento-me no chão, encostada no muro de uma casa de esquina, cujo dono eu não conheço. Mas estou segura, ele não me vê. A sombra é perfeita. O silêncio só é quebrado pelos ruídos que ouço, provenientes da avenida, ou então um pássaro que está cantando em algum lugar à minha direita. Acho que é um bem-te-vi.
Abro minha Coca, sinto aquilo descer corroendo toda minha garganta. Começo a comer o amendoim que comprei. Perfeito!
Vem vindo um homem. Um idoso. Tem cabelos grisalhos, óculos redondos, mas o que me chama atenção é a contradição entre a austeridade de seu rosto, causada pelo bigode bem aparado, e a surpresa em seus olhos, provavelmente imaginando o que estou pensando da vida.
Não me incomodo.
Penso em como eu queria “alguém” ao meu lado naquele exato momento. Está tão longe de mim, e tão próximo.
Agora, vem vindo uma velha japonesa, andando naquela típica ginga nipônica, com um sorriso nos lábios e humor no olhar. Acho que diz “Que vida boa hein?”. Não entendo de cara, mas sorrio mesmo assim.
Absoluto silêncio novamente. Tomo outro gole de Coca, a garrafa já pela metade.
Sinto a dor nas pontas dos meus dedos, pelo all star velho, apertado já. Tem também a dor nas costas; reparo, então, que a parede é chapiscada apenas. Pior do que as duas, é a dor na bunda lá na ponta da coluna, e só então analiso a forma como estou sentada.
Fichário apoiado nos joelhos, pernas abertas. Deve ser uma posição realmente cômica pra quem passa e me observa.
Juntando todos esses incômodos, me lembro da ansiedade da mamãe, e o interrogatório que ela me faz se eu chego tarde em casa.
Acho que é hora de ir. O caminho a pé ainda é longo.
Levanto-me, recolho minha garrafa, o saquinho de amendoim, coloco-os na sacola. Com a bolsa pesada no ombro já, guardo a folha e a lapiseira no fichário, fecho-o.
Já em pé, “alongo-me”. Penso “prefeito desgraçado”.
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